domingo, 16 de agosto de 2009

Uma viagem no tempo.

Quando o mês de agosto começou, pareceu que eu não teria uma folga. Afinal, a ladainha se repetia em doses crescentes e irritantes do que eu teria que fazer daqui para outubro, como um cão fiel faz ao seu dono. Diante do cardápio imenso de obrigações, suspirei ao ver que teria alguns fins de semana de folga, entre eles esse agora em que escrevo no blog.

E apenas pegando um ônibus, vale B, fiz uma das mais maravilhosas viagens de todo o ano: um mergulho na minha própria história, que há anos havia entrado em nebulosa imbernada do esquecimento. O Parque Capibaribe, ônibus que me leva até a cidade natal do autor desse blog, já apontava no limite de São Lourenço quando um sentimento faceiro entrou janela adentro e flechou meu coração com feixes de saudades.

Como se fosse um filme, cada pedacinho da imagem de São Lourenço projetada em minha mente ganhou vida em ritmo lento, para que a saudade fosse ruminada em meu juizo e o pobre do meu coração deglutisse cada grama de lembrança.

Ao passar embaixo do charmoso viaduto que corta a cidade, carinhosamente apelidado de "Ponte de São Francisco" por conta de sua ornamentação, ganhou destaque a cena das minhas caminhadas de ida e volta ao Colégio Anglo, quando eu estudava a 5° e 6° Séries. O sol já estava se escondendo, jogando todo seu brilho no espelho natural que é o Capibaribe, refletindo a beleza de um pôr do sol para toda São Lourenço.

Os ventos da Capital do Pau Brasil já sopram cansado, um ar de uma cidade que vai adormecendo ao final do dia. Enquanto o ônibus passa, vou escutando os rugidos das portas das lojas fechando, o converseiro dos taxistas encerrando o expediente e a fila da padaria fazendo o "balão" dentro do próprio estabelecimento. Aos sábados, os senhores que gozam da folga batem a resenha da semana com o vizinho na porta de casa. E a cada esquina que observo, uma cortada de saudade me emociona.

Logo vejo minha hora de descida. O terminal rodoviário da Praça da Macaíba, encantadamente, me espera. Desço, respiro fundo e parto em direção da casa de uma grande amiga, que há séculos me espera. A conversa soa naturalmente, entre as novidades e os saudosismos, e a mente se rejuvenesce ao ver um grande amigo bem, de pé para a vida e com os sonhos ligados.

A noite se firma diante do céu, a cidade se abrilhanta com os faróis, letreiros e os olhos dos cachorros que ficam roçando nossas pernas pelas ruas. Alguns simpáticos, outros carrancudos. O bom de São Lourenço é que a cada rua é um primo, um grande amigo, um irmão de uma ex-namorada, um tio do seu pai que você esbarra.O melhor foi encontrar a parteira do meu pai, uma senhora que me escapa o nome. Mas o que me impressionou foi sua vivacidade, sua candura...Quantas gerações não passaram por sua mão.

Vou chegando na casa da minha tia Ana, que ainda estava em Recife. Meus primos me recebem, forram logo uma mesa com cuscuz, inhame, café e leite. João Paolo diz logo." Ele só gosta de Café Preto, pôe xícara pra ele". Vou me informando como anda a vida de cada um. A conversa soa tão fouxa, sem preocupação que o tempo passou como um foguete e Tia chegou mais cedo que o esperado, mas na hora de sempr. Beijos, abraços e perguntas pela minha vida.."Como você tá bem, meu filho"

Ao dormir, abro a janela do quarto e sinto a brisa madrugueira sussurando ao meu ouvido lembranças de um velho tempo quando eu habitava São Lourenço. As estrelas de lá são diferentes das daqui. Hoje, ao acordar, conversando com meus primos na varanda, senti falta apenas daquela rede e da coragem de voltar ao mundo cruel da segunda-feira.

E quando peguei o ônibus de volta para Recife foi como se eu estivesse dando um ré num sonho que, como qualquer outro sonho bom, sempre acaba rápido. Ainda no ônibus tentei dormir para sonhar de novo, mas já era tarde. O domingo fenecia, deixando-me apenas com saudade das minhas saudades de São Lourenço.

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