terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Os olhinhos imprudentes ou O cheirinho da burocrata.


Que não me xinguem por aí de cafajeste, cafona ou machista. Apedrejem, mas sem rancor ou títulos inoportunos. Por isso, antes de começar, de fato, esta croniqueta, um aviso a tod@s @s navegantes. Parafraseando o tal Buarque de Holanda, não me levem a mal, me levem á toa, mas, por favor, não pela última vez.

O meu assunto é por demais sincero. Merecia como retrato do texto um gráfico, um balanço comparativo dos últimos anos, mas não sou tão inteligente e confiável assim. Reza uma lenda de que para transformar uma mentirazinha em algo mais convincente basta usar gráficos. Todo mundo acredita.

Para o meu tratado de hoje, uma descrição qualquer já basta. A análise é fruto das ciladas que quase me envolvo por causa da imprudência dos meus olhinhos. Nos últimos tempos, eles têm me feito pagar caro por esse senso observador mais aguçado. O par de retinas tem se apaixonado depressa pelas aparências femininas que cruzam as ruas do Recife, as divinas damas anônimas, que desfilam nesse asfalto tentador.

O DataContos vem reparando nos mínimos detalhes. O carnaval vem chegando e me aparecem as diabinhas, as enfermeiras, as jardineiras, cultivando uma liberdade existencial tão atraente que nos convencem que a beleza termina apenas ali, na fantasia. É um negócio louco de deixar nas alturas qualquer Sr. Folião Olindense. São craques no riso fácil. Joga 10 na simpatia. Tem piadas prontas, rimando com a vestimenta, muitas vezes se esquivando de uma olhada imprudente de alguém.

Também não poderia esquecer da singela beleza daquelas que não ousam fantasias profissionais. São mais tímidas e se conformam apenas com uma blusa adaptada, um retoque na maquiagem e aquele nozinho sacana, que deixa metade do umbigo exposto. Deixa em segredo um abdômen sedutor. Pura crueldade pra quem tem uns olhinhos ácidos e imprudentes.

Mas esses olhinhos, esses privilegiados observadores das damas do Recife, não se contêm apenas com o período de momo e se desandam por outras fases, por outros rostos e outros momentos. Exalam curiosidade, lacrimejam olhares trovadorescos, exaltando um amor cortês pela fêmea desconhecida.

Lança piscadas enviesadas para as universitárias. Destemidas e libertas, figuram na paisagem como uma ode a democracia do olhar. Desfilam soltas, sem calor, tabelam os passos na trajetória do vento, sem o mínimo esforço na sandália rasteirinha.
Suas saias longas provocam outras olhadas imprudentes com seu balé sereno, com os decotes que aparentam o mau gosto de tão gastos.

Ah, essas moças, divinas moças inquilinas do olhar mais investigativo. Dispersam qualquer leitura nos ônibus ao cruzarem todo coletivo. Desembaraçam o cobrador na hora do troco, se desfazem da catraca e humilham meus olhares mendigos, desejando o repouso daquela silhueta passageira, apressada por fugir do foco dos olhares imprudentes.

Não. Não serei injusto de esquecer e excluir desta ode a “burocrata”. É aquela estagiária-executiva, que se põe em blazers, vestidos longos e saltos altos. São as corajosas que embelezam escritórios, habilidosas em pareceres, que escrevem relatórios à mão escondendo um riso sacana por trás do cabelo que faz cortina nas bochechas rosadas pela maquiagem. As burocratas, entendidas de A a Z, sacam os por menores dos protocolos e amansam qualquer agonia de um estagiário-donzelo-estreante do departamento.

Ah, o cheirinho das burocratas. Inconfundível. É um misto de perfume, suor e bronze da hora do almoço, quando ela aproveita e entrega um documento em outra repartição. Cruza as pontes do Recife naquele malabarismo dos saltos, assanhando-se com os ventos machos do Capibaribe, torrando a pele numa charmosa e invejosa Rua da Aurora.

São as damas que esses olhinhos imprudentes não resistem. Trovadores e amantes, cometem a audácia de não se decidir de qual destas aparências, “que toda plebe deseja”, combina melhor com seu projeto de vida,  e voltam a olhar outras damas desse meu Recife.

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