Ainda criança, quando morava
em São Lourenço da Mata, tinha uns atos estranhos de olhar sem rumo e acreditar
no que eu não estava vendo. Era quase como um afago aos devaneios, um carinho
aos desejos. Digo isso, porque sempre tive uma grande lista de sonhos e eternas
vontades. Não me considero por isso um problemático na conclusão desses
projetos, até porque vivo reatualizando, revendo, adiando e descartando
conforme o sopro do tempo. Mas era um menino constantemente atento ao futuro. E
me reconfortava das limitações do presente profetizando com aquela velha máxima
da esperança: “um dia eu consigo”.
Até parece uma prática de
ambiciosos, um costume daqueles banqueiros milionários arriscando toda sua
grana em apostas e desejando dominar todos os espaços. Mas não é esse tipo de
ambição venenosa, inclusive porque não tenho essas ganas todas. Me contento
sempre com o simples, o mais prático e reconfortante que possa ser.
Falo isso porque todo mês de
setembro me bate uma nostalgia de certas coisas. Mentira. Todo dia eu sou
nostálgico, não é uma exclusividade do coitado do setembro. Gosto do que é
velho, aprecio a sensação de conservar. Um dia desses fiz uma faxina no meu
quarto e vi que, realmente, tenho essa tendência de guardar muita inutilidade,
muito papel. Acontece que eu tenho notado que não contenho esse meu lado “conservador”,
no sentido de guardar, preservar e ter o deleite, de um dia, lembrar com
orgulho.
Em uma das minhas gavetas,
por exemplo, eu guardo uma bolsinha simples, transparente e com a marca “Claro”,
repleta de cartas e bilhetes. Foram textos de amigos, escritos num momento de
atenção. Nessa bolsa, encontrei cartas de Marília, uma querida amiga que me
escreveu em 2008 sobre sonhos, sobre a vida, o mundo, a arte de escrever e, no
final, disse que encerrava ao som de Tom Jobim. Que doçura. No exato momento,
me transportei para quatro anos atrás, me sentei ao lado dela que, como
escreveu, estava ás margens do Capibaribe. Foi tanta emoção que até o coração pediu abrigo por causa do vento
frio que corria vindo do rio.
Achei também, em outro
lugar, duas bandeiras do MEPR, movimento estudantil do qual que fazia parte.
Tempos de luta, do fervilhar revolucionário e da prática combativa por um mundo
melhor e mais justo. Lembrei dos amigos e amigas que me cercavam nessa época. E
você percebe que a saudade, entre outras coisas, é um delineador de
personalidade.
Ao mesmo tempo em que lembro,
também projeto no futuro esse espirito
conservador. O que guardo é feito na esperança de encontrar intacto aquele
mesmo momento feliz no futuro, e os planejamentos também são cercados por essa
ansiedade. Em minha lista atual repousam algumas vontades que já foram várias
vezes adiadas: a primeira delas, e meus amigos Tarcísio e Terêncio irão me
perdoar, é montar um bloco. Não sei de onde vem isso, mas sempre fui fascinado
pela ideia de ter um bloco só meu, onde eu escolhesse o nome, juntasse todos os
amigos, improvisasse uma linda camiseta, articulasse um instigante hino e
saísse pelas ruas do Recife e Olinda, somando amigos empolgados na folia. Deve
ser uma satisfação ímpar o orgulho de ser dono ou criador de um bloco. Imagino
o povo dos Vassourinhas, do Galo, do Amantes de Glória, dos Barba, de tantas outras troças que se espalham nas
ladeiras e nas ruas, contagiando o povo com alegria, irreverência, amizade e
paz.
Outro sonho é conhecer Cuba.
Tenho um fascínio por aquele lugar. Uma ilha extremamente política para o
mundo. Meus anseios na pequena Cuba é conhecer o seu lado B, a não sensação
política, os outros sonhos, as suas ruas, o seu povo, conhecer o Frontal de lá,
do Antigo de lá, etc; Ser um turista com vontade de conhecer a intimidade
deles. Imagino o charme que é ouvir Buena Vista em Havana, tomando um Run
cubano, com algumas baforadas dos charutos, lendo os extensos jornais
divulgadores dos Castros, dá uma olhadinha de leve nas saias curtas das garotas
e sentir o verão e sol daquela Ilha. Na verdade, respirar um pouco aquela leve sensação de ser diferente.
Escrever um livro é o sonho
mais pungente. É o tipo de desejo que se intromete em todos os outros planos.
Não há um passo que não seja dado a partir do velho “vamos publicar um livro”.
O blog tem me consolado durante um bom tempo, desde as minhas humildes e
singelas contribuições ao excelente Jornal Cultural, do Tarcísio Camelo. As redes sociais
suavizam um pouco essa minha pressa de colocar os carros na frente dos verbos.
Sou muito insistente nisso de escrever um livro, muito embora me falte assunto,
prumo e manha.
Para o sonho, esse sim,
parece que nasci para ele. Me sinto o mais preparado do mundo para pensa-lo. Se
dependesse dele, já estava voltando pra casa depois de uma baita volta ao
mundo. Mas, como cantava Chico, sonhos
sonhos são. Realizá-los já são outros sonhos.
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