segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Nem toda mentira é absoluta. É só um tempero.

Foi há duas semanas, no campus da UFPE, na minha pequena e agradável maratona rumo ao Portal, cortando os 400m entre o Centro de Filosofia e Ciências Humanas e o Centro de Ciências da Saúde. Ia prosear um pouco sobre História, o mundo, contar, olhar a esperança de perto nos meus amigos. 

No meio do caminho, algumas "salvadoras da pátria" quando a fome acomete os estudantes. Aquelas barraquinhas improvisadas na mala de um Fiorino 98, com aquele velho pastel frio, fantasiado de recheio; aquele cachorro quente sem graça, mas que, na hora que a barriga passa a fazer barulho, é o que salva. 

A dona de uma dessas barracas-salva-vidas me provou que Fernando Pessoa renasce na língua portuguesa onde a imaginação está viva. Dona "dona" estava fazendo o que há de melhor nesse mundo: conversando. Mas não era qualquer conversa: era conversando sobre os outros . E, o que é melhor ainda, não era qualquer outro: era um outro íntimo, chegado, que merecia uns puxões de orelha. Conversava empolgada com um rapaz, que aparentava também ter um grau de intimidade relevante. 

"Aquele bicho é mentiroso demais, rapaz", confessou, sem elegância no tom da voz, o amigo da história. Dona "dona", mesmo contrariada, concordou, deu o braço a torcer e ampliou o assunto: "É mermo, visse? Parece que ele dorme sonhando com a mentira pra contar no outro dia". 

Essa minha tendência de ouvir conversa alheia ainda vai me custar caro, mas não resisti a essa solene advertência, a esse incômodo amigo, em busca de causos sinceros na hora de uma cerveja, durante o dominó. É quando a amiga exige mais veracidade nas mentiras que o amigo inventa pra passa\r o tempo. Isso é muito profundo. 

Toda mentira, mesmo sendo toda, não pode ser absoluta. Tem que ter, no mínimo, uma ponta de verdade, um fragmento de inspiração. Depois de fundamentar, siga com fé nas divagações. Mas, na hora que ouvi  o comentário de Dona "dona", fiquei preocupado com a frequência dos leitores por aqui caso eles descubram que, entre um texto e outro, alguma coisa aqui verbalizada nasce de um sonho, de uma pequena imaginação. 

Mesmo incomodado com isso, fui pra aula no Portal, falei sobre o pensamento Ocidental, sobre esses homens pendurados no tempo, e não larguei aquela sensação estranha, a pedrinha no sapato do pensamento. Em casa, na leseira do andar antes do sono, constatei que não, não é ruim mentir num texto. Aliás. não há mentiras. São histórias que brotam de alguma experiência que eu não tenho controle. Que acontece, mas não sinto fisicamente, que tá no mundo que, de olhos abertos, censuro, renego, podo com os mais afiados valores morais que a palavra mentira ousa me coibir. 

Por isso, amigos, continuem lendo e vejam, como num trailler, que cada texto é um sonho e que não há uma mentira absoluta. É apenas um tempero. 

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